quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

bege

olho vermelho de flash, maçãs podres de amor
o sangue não pára de pingar
e tudo é ainda vermelho, vermelho


sem foco e morno,
porque meu corpo esfriou de súbito
como acontece com os machos que tem asco,
e eu tesa estagnei intacta
extintor também vermelho, fez da chama fiasco azul.

- Prefiro respirar...

preciso há cinco meses, sete chaves, um ano só
triturar toda a doçura fúnebre que nunca jaz,
que nunca dorme,
torturando-me com agulhas fincadas
nos cantos que mais sinto dor:
olhos queimados, orgulho trêmulo.

a cara amedrontada de vingança
enfiada nas penas do teu travesseiro
sufoca um pouco pra morrer um pouco
mas daí volta brilhando como luz neon
fora de moda e triste
como é a nostalgia que agora eu abracei.

sei que os teus panos cheiram pútridos
dos líquidos da novidade
e não, não use perfumes,
não precisa mais lavar as mãos
porque agora gozo é só um instante quente
(e não é isso que me beija a alma)

capa de toureiro, sangue desse bicho
o céu escureceu e ficou preto sem nuvens
e o câncer sai tossido aos poucos da minha garganta
enquanto toda essa lama ainda continua bege.


(...)

mein mongenstern. (II)

Eu sempre soube que ela gosta de sofrer.
Gene dominante, quase externo, por isso somos ela e eu.
E damos as mãos.
As dela são tão macias de displicente cuidado. Ela não usa cremes caros, quase não trata as unhas nem as colore com esmaltes chamativos, limitando-as a tons sempre parecidíssimos de cintilante mediano e branco. Mãos de quarenta e um anos.
As minhas não são bonitas.
Mastigo as bordas das minhas carnes, tirando as cutículas e sangue,e por conveniência ou ansiedade, quase nunca uso esmaltes pra não ter que me enfeitar.
A destra sempre segura meus apoios e é a que mais se arrisca a cheiros fortes de tabaco e vida. A canhota é limpa e não me serve.

A minha mãe não deveria afagar-me, nem beijar minhas maçãs; Não me sinto digna das suas insônias nem de sua ternura mais enrugada e macia que as minhas mãos estúpidas, de dedos tortos.
(Mas ela gosta de sofrer...)

Os meus olhos estão vermelhos de cansaço e esperança, porque são duas da manhã e eu ainda penso inutilidades calejadas enquanto ela dorme ali tranquila porque eu já cheguei da rua e agora está tudo muito bem.

terça-feira, 9 de dezembro de 2008

monólogo do papel crepom

Tu devias relevar os meus impulsos, meu amor.
Eu furtiva não funciono. Sempre me dôo mais do que prometo;
Me desgasto e quase te esqueço quando sinto outros cheiros e outras mãos, me perdoando logo em seguida quando percebo que nessas horas é tu que não te lembras de mim.
(A culpa é tua!)
Há meses grito com o espelho do banheiro palavras de boca machucada de frio; Rasgo os meus verbos, meu versos, meus lábios, pra ver se te enxergo de olhos fechados, costurando minhas feridas com um esforço suave, apesar de cálido, como num blues de pesar, de se abraçar às pernas. (As palavras são tuas!)
Os homens tem cheiro de homens, mas eu só penso no teu cheiro de céu, que se acostumou tão bem à minha pele que de vez em quando me acarinha os pontos, passeando equilibrado, como tu fazia antes pelas minhas linhas. (A culpa é tão minha...)
Eu sou tão nova e poderia me criar, mas não quero.
Tu podias tanto relevar...
Já faz um ano que tu moras no meu ego, no meu fôlego, nos meus dedos e poros.
Então vai, troca as cores dos teus lençóis, enxuga as suas mãos bonitas, me toca um verso de uma nota só...

...Dezembro é ainda primavera, meu amor.

sábado, 8 de novembro de 2008

saideira (de março)

Sabes o que eu faço com o teu amor?
Pois o dispo com olhares serventes e mal comportados que se espalham,
livram-se do castigo de não te sentir e cansados, acabam por se cerrar.
Sou alheia às tuas cenas sôfregas de bebedeira.
Lembro-me de todo aquele "quase" e de quando pintei-me do medo de nunca mais,
que talvez por isso veio em mãos, em cachos, remoendo-me de rancor.
Achas mesmo que com teus lábios tu beijas minha alma?
Tu tocas apenas o meu corpo hirto!
Já não finjo mais quando deixo-me absorver pelos paradoxos absurdos que separam
o meu corpo do tino. Reajo ao teu hálito quente que comove minha nuca frígida
e ignorante aos teus murmúrios embriagados, e já que teus lábios por hora me satisfazem, consinto, te fitando com frieza e cansaço.
Admiro-me cínica quando pousas em mim tuas palavras de amor que de tão brandas e
tão ingênuas, me anulam e enxem meu peito de gelo e mágoa.
Assisto o teu dormir sereno, a boca entreaberta num riso idiota, satisfeito por morar
tão bem no meu desânimo.
Meus dedos livram-se de mim por essas linhas e parágrafos e quase lamentam
o quanto essa inércia me acalanta. E me corrói.

terça-feira, 4 de novembro de 2008

carta de dois fôlegos.

A ti,
embrulho as minhas ternuras num pedaço de papel grená porque não sei fazer caprichos nem desenho muito bem não entendo de cores e acho feio marcar de batom o que me é tão limpo, até porque eu só quero que tu te lembres da minha boca enquanto tua em beijos secos que são dignos de palavras como "amor" que são tão lindas e tão desinteressantes (as palavras, não os beijos).
escrevo atenciosa o que há de mais sereno aonde exista mais candura o que é macio e azul porque são as besteiras mais doces que posso reunir agora e te entregar nesse papel amassado e virgem como são as minhas mãos escrevendo pela primeira vez uma carta de amor.
Amor amor amor:
Frizando assim porque aproveito do meu ímpeto de esquecimento do que eu realmente sou, uma hora dessas a lucidez já tá dormindo e o que existe é apenas tinta deslizando devaneios e eu não vou dar-me o luxo do convencional porque lembrei-me que mesmo se quisesse nem uso batom nem faço poesia então te beijo aqui de longe com os olhos fechados e aperto bem a boca
(pra ser bem ternura) e faço isso bem de longe pra não te acordar

na mesma hora em que eu respiro
e desanuviada
me lembro que não posso tocar-lhe as mãos
(mas talvez eu nem me importe tanto)
já que nem conheço quem tu és.

terça-feira, 21 de outubro de 2008

quando me vem o acalanto é quando me cria a compaixão.

eu não poderia jamais afastar suas mãos dos meus cabelos,
sabendo que teu consolo precisa saber das minhas tristezas.
(eu posso até chorar pra que tu não percas tal cargo)
eu não posso sentir raiva de tua cor de ouro
(principalmente dela é que não posso sentir raiva),
não posso sequer exigir-lhe que te difiras de mim.
e aí quando tu me perguntares por que choro,
e quando eu invariávelmente disfarçar minha lucidez
(com meu gosto amaro de cerveja e tabaco)
portarei-me como a mais vil das pecadoras,
(das mais líricas pecadoras)
pra que tu me devores com seus olhos lilases
e transcreva toda a minha conduta rubra
para a sua candura fria
(de ciano e amarelo).

terça-feira, 14 de outubro de 2008

sossega Daniel,

que em algum lugar, tu tens nome de anjo.
Em algum lugar tu lavas teus cabelos caracóis com seda e ouro e não te impregnas do cheiro de fumo.
Tuas unhas são brancas e não te coçam aflição de tristes culpas e tu provéns de boa memória para guardar os nomes de tantas morenas.
Tua vista é sempre limpa e ampla e tu podes tragar tuas dores sem paisagens que te distraiam (inclusive nos domingos que são dias de sol). Tu vais poder soluçar sem se importar de fazê-lo, na companhia de sua cachorra gorda de passos calmos e preocupados (Ela ainda será tua única amiga).
Tu podes ali, habitar de vez aquela lua cheia que te empresta isca, enchendo as têmporas de desperdício enquanto o teu membro pulsando sangue não invade as carnes de marias burras.
Em algum lugar tu descansas manso nos zeros dos teus vinte e tantos, mordendo o vazio no seu travesseiro e tentando chorar um pouco, pra ver se aduba tanta solidão.

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

joana rosa

De início, quando olhei-a fixamente no rosto, não vi seu rosto armado em indiferença, nem apenas seu sorriso vermelho de deboche.
Vi beleza num semblante de vinte e poucos anos, contrastando com o inchaço armado nos cantos mais frágeis de seus traços finos.
Teriam-na castigado por ser mulher e ser tão crua?
O desequilíbrio cresce no pranto da indiferença e a necessidade da agressão vem da impotência do toque.
Ele, fora do eixo, a chamara de covarde, confundido sua indiferença com imparcialidade. E ela, invariavelmente, não se impediu de sorrir(Ela, que por ironia, não chora).
Há muito, lastimou desamores, no tempo em que doava-se demais no medo da perda e dos nãos incertos que teimosa, resistia.
As lágrimas foram o primeiro direito que o homem tirou dela.
Logo depois vai o seu dinheiro, daqui a pouco depois levam seu amor. Levam seu tempo e seus encantos(Joana passa...)
Na rua, castiga-se apática, despreocupada em esconder hematomas fundos com óculos de sol.
Com o seu olhar, congelaria os mais feridos orgulhos, no mesmo instante em que repuldiava cínica a compaixão de tantos falsos moralistas.

Ela não chora, mas também não ri.

quinta-feira, 31 de julho de 2008

guria.

su
acalanto tal tierno
enfeita as cores que ela enxuga
cor de brilho, céu anil
meu afago
que é lenda
e que é linda
e que me lê
ela nem sabe, mas tem cheiro de mel.

domingo, 27 de julho de 2008

no barro,

eu escuto os teus soluços
ganidos
e assisto esse sismo
pequeno
eu não te protejo.
minhas mãos contornam o seu rosto
de longe
e eu não quero me molhar.
afasto os meus pés
saltito
e tu exalas a angústia da solidão
vazia
tu sujas meu sapato
preto
com gotas de lágrimas que não brilham.
cai, cai, cai.

sábado, 26 de julho de 2008

mata-borrão

dentro de mim existe
o fardo, a massa, o tóxico
que guarda descanso pras tuas mãos
(desde que estejam vazias.)
na fotografia te relembro os olhos
vidrados, inertes, brilhantes
enquanto te beijo o rosto
deslizando as cicatrizes
como um mapa
milimetricamente desenhado
aos meus dedos cálidos
aos meus poros ativos
na erupção do choro,
do riso, do êxtase
na firmeza crua
dessas mãos que não tem fim.

quinta-feira, 27 de março de 2008

o temporal.

Gritos de tempestade invadiam a noite limpa.
O vento frio dançava ríspido pelos seus cabelos, no momento em que mais um relâmpago riscava o céu escuro. Aurora deliciava-se ao contar os segundos antecedentes de uma resposta esbravejante de mais uma trovoada.
Era bonito de se ver tamanho contraste e desordem.
Observava pensativa o barulho da água lavando uniformemente o asfalto cinza e triste. Assistia o escorregar daquilo que parecia um pranto, descendo arrebatador pelas ladeiras vazias até chegar ao ralo.
Ela queria descer as escadas do prédio e lambuzar-se de chuva e riso.
Valsaria nas poças de lama. Deixaria as águas banharem seu rosto claro e invadirem em respingos o seu paladar. Ficaria assim até seus cabelos se encharcarem, suas mãos se engelharem e ela sentisse o gosto da chuva no céu da boca.
Satisfeita, subiria as escadas correndo, molhando os corredores com seus passos largos. Os cabelos negros cairiam alegres sobre a camiseta verde, colada no peito. Secaria os pés com vã cautela no tapete da sala, afim de que sua mãe não descobrisse a travessura e depois deleitaria-se na água quentinha do chuveiro, que tomaria poderoso todo o frio da sua pele.
Queria abraçar-se à toalha seca e assistir ao final da chuva, como se estivesse na platéia de um belo show.
Não o fez.
Sentiu com os dedos as gotinhas redondas que se formaram no vidro da janela. Juntas, escorregara,-se como lágrimas aborrecidas, tão inconformadas como Aurora também estava.
Havia perdido o espetáculo porque tem medo do trovão.

quinta-feira, 13 de março de 2008

ritual.

Recolho toda a tristeza antiga que ainda me resta e me atormenta.
Fito-me com olhos vermelhos que refrescam meu rosto refletido no espelho sujo. Escolho o ângulo em que me sinto mais bela, e tal beleza distrai soluços pausados que se desinxam baixinhos afim de não me condenarem.
Grito desamores mudos por entre versos de edredon. Quero molhar todo o meu corpo de lágrimas e quem sabe assim secar minha alma, mas o pranto foi-se embora saciado. Me alivia.
Abraço minhas pernas e escondo meu rosto nos cabelos curtos, os sempre reféns de meus subterfúgios. Não me acalentam mais, e pouco aquecem minha nuca, acostumada com tais revoluções aflitas.
Visto meus ombros claros de menina-moça que não vi crescer, como se o tempo escorregasse arredio pelos meus dedos tortos, cedendo rastros de memória à minha escrita densa.
Beijo meus lábios refletidos, inchados de pranto e de um vermelho doce. Meus olhos roucos me sussurram o canto da ciranda triste que não danço mais.
Tenho dezoito anos de idade e não caibo mais em mim.

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

preliminar.


O teu sim passeia no meu não salgado:
Virou candura.
Tropeça na garganta ávida,
Risca a voz, atropela o pranto
É limiar e paciente, e ensaiado e sorrateiro
Mas repetiu-se tanto
Que logo virou refrão.
Assombrou e embaraçou
Os fios da minha voz gelada
Calejada, que no escuro
Confundiu-se muda em vão.
Agora em mim teu sim espalha
Comove-me por minuto,
Depois pérfido e astuto,
Contradiz-me e condena
Que o positivismo ralo
De tão frágil é fantasia.
Por isso, pro meu destino,
Decido por fim o não.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

quatro e trinta e oito.

Eu escrevo agora, em linhas de dedos volúveis. Escrevo insólita, quase crespa, ciumenta dos meus próprios anseios, já que de ímpeto não me servem mais...
Provenho agora com circunstâncias frívolas, das quais não me dignifico nem me separo, por que são de viés, de revés, de pena.
De mim toda quase toma ósculo latente, abraço semi-dado, carinho nada oculto e por isso fica, já que parte o meu pranto em meio, lábio doutro, choro ambos, tão serventes e tão prontos aos meus dedos de torpor.
Quando passa, finjo que nada e de nada gratifico, já que o sal das minhas lágrimas ainda me saciam. E é nesse momento que vejo o reflexo brusco da menina marcada de azul que ainda lastima a falta de um antes sol que virou nuvem escura, quase chuva-tempestade.
Sabe? É que cansa o quase-amor.
Cansa, quando as palavras massantes compensam as ternuras ocultas e ingênuas, que de tão inocentes deslizam sonoras e se dissipam nos meus gritos surdos.
E a tua ganância pruriginosa ainda me cala, me incomoda, mas retém, por isso fujo entre cobertores e líquidos vorazes, que me submergem de rancor e sono.
E adormeço.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

cinzeiro.

Afasta de mim tuas mãos tão rijas de dedos tesos que já não fremem mais, indecisos, inertes,
saudosos dos tempos de confins.
Deixei lá tua boca, que ainda tomava os poros do meu ser, que tímidos recolhiam-se ansiosos se rendendo à ti. Era assim quando arquejantes, meus olhos fracos lutavam heróicos na tarefa árdua de não se fecharem (pois do ápice do amor as pálpebras pesadas procuravam ternura, por isso pousavam calmas e desobedientes no teu peito).
Pois agora cala-te, guarda tuas palavras de amor que já não passeiam mais por minha mente enfadada, nem me arcam risos inatos de bocejos solitários na cama de solteira.
Leva embora o teu capricho de ainda desejar.
Leva a ingênua ânsia de voar descalço no céu da minha alma, agora fria.
Teus passos brandos e sorrateiros calejaram, pisando forte nos pontos calculistas daquele meu relógio frívolo...
É que o teu amor morreu no tempo da minha paciência.