Quando o menino deitar-se ao meu lado, já terei memorizado todo o tempo daquelas noites de sempre verão.
Ele perguntará sobre o suor e eu que nunca fui de suar tanto, enfatizarei com reclamos um calor exorbitante que eu jamais sentia, enterrada entre os cobertores de frio condicionado.
Da janela de dentro assistia a dança dos insetos na lamparina e lá em cima, na parte alta da casinha, confundia vagalumes com um disco-voador. O velho ria de mim e eu me zangava fácil, e ao lembrar disso, cantarei para o menino aquela canção sobre borboletas e frio, acentuando bem o sotaque sertanejo e lhe fazendo rir de mim um riso alto, me reticenciando curioso.
Os cachorros eram me dados feito recompensa e a cadela preta cresceu tão cheia de vontades quanto eu. Sorrindo, contaria do armazém de Catarino, onde eu ganhava pipocas e doces choramingados entre seus dedos de fumo enquanto ele, rabugento, grunhia agrados despercebidos ao lustrar a carabina e tentava me fazer medo com seu dente amarelo de ouro.
O menino nessa hora vai precisar fechar seus olhos, (já que do apartamento é tão difícil imaginar) pois um porco selvagem e cinza me seguia velozmente no terreno de Afonso (vinha em minha direção como alvo e hoje só posso imaginá-lo com presas enormes como predador). Eu após a fuga choraria descabelada, rogando pragas desafinadas sobre o animal, o meu velho, o café negro e todos aqueles bichos de pé.
O velho me colocava pacientemente a chacoalhar na carroceria do carro e o vento encaracolava as minhas raízes, como que para me fazer sossegar do choro que eu nem lembrava mais...
O menino, sobre o meu ombro, tomaria fôlego das minhas lembranças e eu guardaria aquele quintal pra outra noite, onde o homem que sumiu jamais se perdeu na mata, quando aquela pampa usada ainda não foi vendida, onde não se passaram mais dez anos daquele sereno verde meu.
3 comentários:
Amor, li agora de novo e vi que dá num curta essa história do porco e causos contados no apartamento. Vou fazer meus contatos.
Te amooo, sua artista!
Ó, fia, fazia um tempo que não conferia a tua observância, mas que grata surpresa para uma tarde abafada dessas me deleitar com as tuas histórias!
Mila, Amor...hora de retomar esse trabalho tão cheio de ti...amo ler o que você tem nessa cabeça tão cheia de detalhes...VOLTA!
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